quinta-feira, 7 de outubro de 2010 | By: Ócios do Ofício

Mentiras


           Coloquei as mãos na boca, como se elas pudessem filtrar as palavras que eu dizia a fim de torná-las verdade. Não consegui que o fizessem. Minhas pupilas dilatavam-se involuntariamente, assim como meu coração palpitava sem ritmo, ao menos, definido. As frases soavam ironicamente. Minhas mãos tremulavam equiparando-se ao tom de minha voz. Meu corpo dedurou-me. Nem meus dedos cruzados puderem livrar-me.
            Minhas expressões, mesmo que as quisesse e tentasse controlar, indicavam até ao ser mais insensível e desprendido que eu mentia. Não por gostar. Nem por querer enganar outrem. Mas por proteção. Instinto talvez. Mas com toda convicção, egoísmo.
Quem nunca mentiu? Ou. Quem nunca omitiu a verdade? Por qualquer motivo, razão ou circunstância. Banindo-me da hipocrisia e da responsabilidade de defender essa atitude repugnante, sei que se faz necessária quando se trata de sobrevivência. Primitividade. Por não termos mais os dentes pontiagudos, capazes de rasgar e perfurar até a mais dura das superfícies, e as unhas rígidas e afiadas, atuantes como garras, utilizamo-nos de outras armas.
Para sermos aceitos, mudamos nosso tom de voz e até o modo como nos vestimos. Para não perder um amigo, concordamos com todas as suas atitudes, se não todas, com a maioria. Mal sabemos que ser amigo é, também, apontar falhas. Para não desagradar, dizemos o quão linda ficou aquela vestimenta, mesmo que ela tenha ressaltado todos os pontos, supostamente, fracos daquele indivíduo.
Tenho a extraordinária mania de mentir para mim mesma. Estranho não? Auto boicote. Crio coisas que não existem, imagino cenas que nunca irão acontecer, fantasio histórias, idealizo momentos. Malditos mecanismos de defesa do ego. Queria poder confiar em mim. Não mais nos outros.
É difícil aceitar que todos mentimos, sem exceções. E também de assumir que meias verdades são mentiras completas. Ao contrário do que dizia Cazuza, se é que elas existem, mentiras sinceras não me interessam, não me interessam.

Bruna Silveira
sábado, 2 de outubro de 2010 | By: Ócios do Ofício

Aprisionados

          
         Duas pessoas caminham pela rua. Conversam e olham fixa e apaixonadamente uma para a outra. Não se tocam nem se beijam, apenas se admiram. Gravam para si os trejeitos, as feições, as expressões, as caretas e os sorrisos. Conquistam em gestos, em palavras. Provocam mutuamente. Despertam sentimentos, não necessariamente bons.
            Enquanto estão lá a incitar emoções positivas, outros estão a se odiar. O ódio não encontrasse apenas entre inimigos. Ele está também em relações que, na teoria, deveriam ser de amor. E o que é o amor? Sem saber explicar, posso resumir. Um sentimento. Amor de pai e filho, entre amigos, de homens e mulheres. E é neste último, o meu foco.
Seres tão complexos e diferentes uns dos outros. Com tantos defeitos e peculiaridades. Com objetivos e anseios antagônicos. Por que será então que todos buscam incessantemente a sua metade da laranja, a sua tampa da panela, a sua cereja do sorvete? Por sermos humanos, temos a necessidade de amar e ser amados, concomitantemente.
Qual a causa de submetermo-nos a outrem? Equilíbrio, segurança, estabilidade. Nenhum destes motivos, porém, são justificáveis. Suportam-se, fingem ser o que não são, adotam máscaras. Cedo ou tarde, e com toda certeza, elas cairão. O medo de ficar sozinho transformará você em um prisioneiro. Prisioneiro de si mesmo. Liberte-se. Prefira ficar sozinho a viver atrelado a uma relação de comodismo. Por permanecer inerte, você perde inúmeras chances. Se você não ama, deixe, abandone, descarte. Se você ainda ama, lute. Não deixe que a aliança seja o único símbolo de que há amor. Demonstre.

Bruna Silveira